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Channel: Neuropsicopedagogia na sala de aula
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Num rotineiro gesto, grandes aprendizagens...

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     Sempre me considerei alguém muito prática, objetiva e capaz de fazer mil coisas ao mesmo tempo (rs..nada pretensiosa). Entretanto, a vida nos proporciona momentos de mudanças, de contemplação, de aprendizado... e nessas minhas andanças com alunos de inclusão tive o privilégio de aprender muito. Em especial, lembrei de um aluno: amado, dócil, era a calma em pessoa. Ele era meu ponto de equilíbrio, mas tinha “uma mania” que nos primeiros meses passou despercebida, entretanto a medida que o ano foi passando, aquilo começou a me parecer inconveniente...

      Quando solicitava que colocassem o caderno sobre a mesa para a cópia das atividades, observava aqueles dedinhos, folhando, uma a uma, as páginas do caderno até chegar naquela que correspondia ao dia. Pare pra pensar: durante o ano, as páginas escritas em um caderno vão aumentando! Então, pensei que deveria tornar aquilo mais ágil...
   Na minha concepção era bem mais prático ir lá pegar o caderno da criança, abrir rapidamente no local a ser utilizado... e era o que eu fazia ( a inexperiência nos faz tomar decisões inapropriadas), porém na mesma rapidez do meu gesto, ele fechava o caderno e começa tudo novamente. Para um bom entendedor um simples gesto basta! Não estava ensinando de modo eficiente, Quem sabe algo mais criativo, então confeccionei com todos os alunos diversos marcadores de página pensando que assim iria motivá-lo a abrir na “página certa”. Tentei por vários dias mostrar que meu modo era muito mais prático, porém existem momentos em que a atitude mais nobre é o respeito ao ritmo do outro. Relacionei o caso até com o filme “Uma lição de amor”, onde o personagem Sam Dawson, demonstrou em várias passagens sua obsessão pela organização, pela necessidade de seguir ações passo a passo. 
      Nesse momento percebi que ter o entendimento que nem tudo que me parece bom, prático e eficiente pode ser para o outro, pois mudanças de atitudes podem ocasionar o caos na vida de algumas pessoas. E foi assim que desisti de ensinar “meu modo eficiente” ao aluno e me rendi ao ensinamento que ele estava me proporcionando, pois seu simples ato trouxe-me muitas reflexões:
- Por que pessoas com deficiências tem a tendência a seguir rotinas tão minuciosas? (e aqui, foi meu ponto de autorreflexão: será que são somente eles? Será que vivemos tão aceleradamente que não paramos para perceber quais rotinas seguimos e não conseguimos nos desvencilhar, mesmo sabendo que haveria um modo mais eficiente de fazê-lo?)
- O que acontece quando nossas rotinas/rituais são desestabilizadas? (lembram do livro “Quem mexeu no meu queijo?”, mudanças podem nos proporcionar novas aprendizagens, entretanto há um ponto enorme de desequilíbrio entre aquilo que fazemos habitualmente e o novo ponto de hábito. Pois na verdade, estamos modificando nossos hábitos e quando isso acontece, proporcionamos mudanças inicialmente em nós, porém todos a nossa volta são afetados também).
     Isso mesmo, todos seguimos rituais, seja no nosso modo de agir, no nosso modo de sentir, no nosso modo de ser/estar. Falamos as mesmas frases para determinadas situações, nossas atitudes nos mostram que padrões seguimos. Então, para nos conhecer e conhecer o outro basta observar quais páginas estão sendo viradas. Tudo são indicadores de sinais, convites à análise e autoanálise. Para nos conhecer basta nos observar, para conhecer o outro basta observá-lo, pois num mundo muito mais acelerado que daqueles que apresentam determinadas síndromes, transtornos, distúrbios nos mostramos tão iguais, tão repetitivos, tão escancaradamente ritualísticos, entretanto como somos mais ágeis damos a impressão de não sermos assim, mas há todo um processo que compõe nossos resultados, e assim como aquele aluno que não se permitiu mudar, necessitou ficar folhando página por página, faço o seguinte questionamento: quais pontos de nossas vida que não nos permitimos mudanças e necessitamos tanto seguir rituais?

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